Os serviços de fiscalização independente são utilizados em geral em projetos grandes e complexos projetados por equipes internacionais. Esses projetos são em geral chamados mega-projetos uma vez que podem comportar até dez milhões de pés quadrados de área útil e uma carga de ocupantes semelhante a população de uma pequena cidade. Esses projetos envolvem em geral um número considerável de pedidos de dispensas, equivalências e projetos baseados no desempenho por parte da equipe de projeto para cumprir com as necessidades do projeto e do uso. Eles tornam-se freqüentemente uma mistura de requisitos de códigos locais, práticas internacionais de segurança contra incêndios, e projeto baseado no desempenho.
Os projetos que recaem nessa categoria incluem os cassinos do estilo de Las Vegas que estão sendo construídos em Macau, que incluem jogos, hotel, lojas, locais de reuniões de público e espaços de suporte. Em geral são divididos em vários projetos mais pequenos, ou zonas, para facilitar a sua gestão. Muitas vezes, para acelerar o processo de construção, utilizam-se diferentes empresas de proteção contra incêndios em um único projeto, o que complica a coordenação da revisão da documentação, a observação da instalação e a posta em serviço.
De acordo com os meios de informação, Macau, a ex-enclave portuguesa na costa sul da China, ultrapassou Las Vegas como o maior mercado do jogo no mundo, alimentado por um boom no desenvolvimento dos cassinos. O crescimento foi em parte impulsionado pela chegada de alguns dos maiores operadores de Las Vegas. O Sands Macau, que abriu em 2004, é um dos maiores cassinos do mundo, enquanto Steve Wynn, uma legenda de Lãs Vegas, abriu em setembro o Wynn Macau em Setembro, avaliado em 1.2 bilhões de dólares.
Outros super cassinos previstos para este ano incluem o Venetian Macau e o MGM Grand Macau. O desenvolvimento do Venetian, com um valor de 1.8 bilhões de dólares, vai ancorar a nova Cotai Strip do enclave, que na sua primeira fase de desenvolvimento conta com sete hotéis e 19000 quartos.
Enfrentadas a essas complexidades, as jurisdições locais buscam freqüentemente assegurar-se que o projeto e a instalação dos sistemas contra incêndio e de proteção da vida desses empreendimentos sejam submetidos a verificações e ensaios completos por uma entidade independente. A abordagem da fiscalização independente oferece as autoridades locais um meio de aplicar efetivamente os requisitos de segurança contra incêndio e proteção da vida oferecendo ao mesmo tempo aos proprietários e seus projetistas a margem de manobra necessária para que as suas instalações projetadas com criatividade sejam construídas contando com prazos de projeto extremamente agressivos.
O processo de fiscalização independente implementado na maioria dos mega-projetos internacionais inclui cinco tarefas básicas. Essas tarefas são:
- Verificação do relatório sobre proteção da vida e proteção contra incêndio
- Avaliação das abordagens de métodos e materiais alternativos
- Verificação dos projetos de proteção contra incêndio e proteção da vida
- Verificação da instalação dos sistemas de incêndio e proteção da vida
- Presenciar os ensaios de posta em funcionamento dos sistemas de incêndio e proteção da vida
É essencial documentar todas as verificações ao longo do processo de forma a constituir um claro “registro escrito” das ações e atividades dos fiscais independentes. Além disso, é importante que haja um diálogo permanente entre o fiscal independente e os agentes de implementação dos códigos locais de forma a garantir que ambas partis concordem quanto ao pormenor das verificações e do processo durante toda a duração do projeto.
Proteção da vida/relatório de proteção contra incêndio
A primeira tarefa consiste em analisar a abordagem global do projeto em relação à proteção da vida, documentada pela equipe de projeto em forma de Relatório sobre proteção da vida/proteção contra incêndio. Esse relatório é preparado no início do projeto como uma ferramenta para a equipe de projeto, as autoridades locais, e os empreiteiros. O relatório em geral é preparado pelo consultor em proteção contra incêndio do proprietário e fornece um panorama da abordagem do projeto em relação ao cumprimento dos códigos. Também esboça os requisitos de sistema em relação à proteção da vida e proteção contra incêndio e trata dos eventuais elementos especiais de projeto. Por exemplo, uma coisa tão simples como uma cobertura para uma garagem exterior de ônibus pode levantar diferentes questões incluindo:
- A cobertura precisa proteção por sprinklers automáticos?
- Que tipo de material pode ser utilizado para a cobertura e as clarabóias?
- O suporte da cobertura precisa uma classificação de resistência ao fogo?
- Pode haver uma armazenagem regular de combustíveis e veículos em baixo da cobertura?
O relatório de proteção contra incêndios deveria justificar todos os aspetos do projeto proposto no contexto dos requisitos dos códigos aplicáveis. Um relatório de proteção contra incêndio bem escrito resume essas questões de maneira a que a conformidade do projeto possa ser facilmente verificada pelo agente de implementação do código ou pelo fiscal independente. É obrigação do fiscal independente assegurar-se que o relatório contém um nível suficiente de documentação e detalhes que descrevam claramente a abordagem de projeto de maneira a que, mesmo anos mais tarde, o processo de decisão relativo a proteção contra incêndio possa ser compreendido claramente.
Análise dos materiais e métodos alternativos
A segunda parte das responsabilidades do fiscal independente é a análise dos pedidos de materiais e métodos alternativos (AMMRs do inglês) apresentados pela equipe de projeto. Cada solicitação deve ser analisada com o máximo cuidado não só em relação a sua viabilidade técnica, como também em relação ao possível impacto da solicitação sobre as operações dos corpos de bombeiros locais ou filosofias específicas de proteção contra incêndio adotadas pelos agentes locais de implementação dos códigos. O fiscal independente deve lembrar-se que está atuando como um agente das autoridades locais de implementação dos códigos, mesmo se os seus honorários são pagos pelo proprietário. Deve-se manter uma posição neutra de advocacia na avaliação de cada pedido. O critério de aceitação deveria ser unicamente baseado no mérito técnico de correspondência com o nível de segurança contra incêndio/proteção da vida pretendido pelo código bem como o impacto sobre as operações dos bombeiros locais.
Entretanto, é também necessário tomar em consideração qualquer precedente que tenha sido assentado em trabalho prévio de projeto realizado pelo fiscal independente para o proprietário ou com a equipe de projeto.
Análise do projeto dos sistemas de proteção contra incêndio e proteção da vida
A seguir a aceitação do relatório de proteção contra incêndio e dos AMMR’s, o próximo passo no processo será a avaliação dos desenhos do sistema de proteção contra incêndio e dos desenhos dos empreiteiros para verificar a sua conformidade com o relatório e os AMMR’s. Em mega-projetos internacionais, a qualidade global dos desenhos apresentados pode ser boa, mas em geral a documentação de projeto está incompleta no momento da sua primeira apresentação. A maioria dos empreiteiros locais não está acostumada a submeter o nível de detalhe necessário para demonstrar a conformidade com as normas aplicáveis da NFPA. Em Ásia, os empreiteiros estão em geral melhor familiarizados com o British Standard Pipe Schedule Method para desenhar os sistemas de sprinkler mas têm menos experiência com os métodos de projeto por cálculos hidráulicos da NFPA 13. Sendo assim, os empreiteiros são em geral competentes e diligentes no projeto do sistema, mas o nível da documentação de justificação do projeto apresentada pode não ser suficientemente detalhado para demonstrar a conformidade com o relatório de proteção contra incêndio.
Verificação da instalação dos sistemas de proteção contra incêndio e proteção da vida
Durante a instalação dos sistemas de proteção contra incêndio, uma parte das obrigações do fiscal independente consiste em realizar pré-inspeções para avaliar o progresso dos empreiteiros. A intenção é identificar trabalhos corretivos na fase inicial e realizá-los antes que o problema de instalação se repita demasiado ou que a instalação esteja coberta por tetos falsos ou paredes.
O processo de pré- inspeção em geral é considerado tanto pelos empreiteiros como pelos agentes locais como positivo e benéfico para o processo geral de construção. A maioria dos empreiteiros em mega-projetos internacionais é diligente e proativa em relação à programação das pré-inspeções, apresentando desenhos atualizados, lanternas elétricas, água para beber (onde o clima é quente) e disponibilizando plataformas de tesoura para o trabalho em ambientes de tetos elevados. A maioria dos empreiteiros tem demonstrado boa vontade e disponibilidade em relação às deficiências de instalação, alguns chegando mesmo a identificar as suas próprias deficiências em conjunto com os revisores independentes durante as inspeções de terreno.
Posta em serviço dos sistemas de proteção contra incêndio e proteção da vida
O passo final do processo é o ensaio final e a posta em serviço de todos os sistemas de proteção contra incêndio do projeto. A preparação dos cenários de ensaios extensivos a serem incluídos no relatório final de ensaios preparado pelo revisor independente pode levar semanas para os mega-projetos internacionais. Em geral, as zonas de projeto têm calendários de construção diferentes, devido a necessidade que os proprietários têm de ocupá-las em uma certa ordem. A complexidade dos ensaios finais aumenta quando os sistemas de proteção contra incêndio devem funcionar como um todo e as zonas dos edifícios também devem poder funcionar independentemente umas das outras de maneira que seja possível emitir um certificado de ocupação para uma zona do edifício antes que as outras zonas estejam prontas.
Quando os empreiteiros indicam que os sistemas estão prontos a testar, todos os dispositivos devem ser ensaiados em primeiro lugar, o que pode totalizar dezenas de milhares. Muitos dos dispositivos são instalados em tetos altos cujo acesso pode constituir um desafio. Todos os componentes dos sistemas devem ser inspecionados e ensaiados, e todas as funções de controlo devem ser verificadas. Isso inclui a verificação que as fronteiras de zonas do sistema, as fronteiras das zonas de evacuação, as fronteiras de controle de fumaça coincidem, e que as funções de output do sistema são ativadas pelos sinais de input de alarme de incêndio corretos.
Desafios de fiscalização internacional independente
A prestação de serviços de fiscalização internacional enfrenta em geral quatro áreas principais de desafios:
Documentação
O desafio relativo à documentação para a fiscalização independente em projetos internacionais consiste em rastrear o estatuto das submissões do sistema de proteção contra incêndio pelo empreiteiro.
As submissões de sistemas de proteção contra incêndio vão requerer freqüentemente ciclos múltiplos de análises e revisões dos vários ramos incluindo sprinklers automáticos, alarmes de incêndio, HVAC, Controlo de fumaça e saídas para cada zona e sub-zona de projeto. Esse processo iterativo pode resultar em mais de 100 revisões de submissões, que podem requerer tradução e discussões com agentes locais por meio de intérpretes. O empreiteiro pode também requerer uma leitura prévia ou versão preliminar dos comentários, uma reunião e uma oportunidade de fazer algumas correções antes que a carta oficial de revisão seja finalizada. Os proprietários e os agentes locais procuram muitas vezes informação acerca do estatuto de uma submissão em particular, que pode ser rastreada com comentários em uma lista mestre em forma de tabela.
Questões relativas ao pessoal
A flexibilidade no uso da força de trabalho é crítica para prover o nível de serviços independentes esperado pela autoridade local responsável pela implementação dos códigos para a maioria dos mega-projetos internacionais. Isso é um desafio considerando o número usual de empreiteiros e zonas, o faseamento da construção, e a programação dinâmica da revisão dos desenhos executivos dos empreiteiros, as inspeções e os ensaios. Fornecer os recursos humanos e a presencia física na região é também crítico para o avance das relações, o respeito mútuo, e uma ambiente de trabalho agradável com as autoridades locais de implementação dos códigos.
Um outro desafio relacionado com os recursos humanos é a gestão de um escritório na região com diferentes grandes projetos em curso onde os engenheiros de proteção contra incêndio são escassos. Se forem abordados para trabalhar em um novo mega-projeto como fiscal independente ou como consultor da equipe de projeto, considerem que esse trabalho pode ter um impacto significativo sobre os recursos humanos envolvidos e o tamanho do gabinete. As decisões devem ser tomadas para encontrar pessoal competente para expandir o tamanho do escritório, recorrer a mais recursos de apoio nos EUA, ou rejeitar o trabalho. Um escritório no exterior com uma carga de trabalho completa que enfrenta a sua primeira revisão de submissões de desenhos de layout de sprinklers para dois milhões de pés quadrados, por exemplo, deve ter reservas flexíveis de mão-de-obra as quais pode recorrer para completar esse tipo de tarefa. Esse não é um tamanho irrealista de submissão de projeto de sistema de proteção contra incêndio para mega-projetos no sudeste asiático.
Barreira lingüística
Os empreiteiros muitas vezes respondem aos comentários da fiscalização, e o fiscal independente deve por sua vez realizar uma nova ronda de verificação e resposta. Os agentes locais de implementação dos códigos podem também realizar fiscalizações independentes e fornecer comentários aos empreiteiros. Os empreiteiros vão freqüentemente responder a esses comentários, que serão revistos em conjunto pelo fiscal independente e pela autoridade local. A grande quantidade de correspondência e discussão complica-se evidentemente devido às barreiras lingüísticas. Os documentos finais oficiais de fiscalização deverão sempre ser submetidos na língua local.
Questões técnicas
Além dos desafios da gestão de projeto, existem diferentes desafios relativos a proteção contra incêndios associados aos típicos mega-projetos internacionais. Diferentes tipos de sistemas de proteção contra incêndio e de funções de controlo como a detecção, a supressão e o controlo de fumaça são monitorados e controlados por sistemas múltiplos de sistemas de alarme em rede. O conceito global de projeto deve ser cuidadosamente documentado e o zoneamento e o seqüênciamento do sistema para as zonas de sprinkler, de alarme de incêndio, de controlo de fumaça, e de evacuação devem ser projetados, coordenados, instalados e ensaiados com cuidado. Esse aspecto complica-se devido à construção e ocupação faseadas das zonas de construção. A coordenação de todo isso com os diferentes projetistas e instaladores dos sistemas múltiplos em rede nas várias zonas do edifício seria um desafio mesmo sem a barreira lingüística e outras diferenças culturais aqui descritas.
Conclusão
A prestação de serviços de fiscalização e inspeção independente aos agentes de implementação dos códigos de proteção contra incêndio e edificações em grandes projetos no exterior, implica muito tempo e muitos esforços adicionais para superar os desafios. A prestação desses serviços no exterior apresenta desafios técnicos e de gestão de projetos que excedem aqueles que se enfrentam em projetos semelhantes de grande envergadura e complexidade nos Estados Unidos. Em Ásia, o desenvolvimento das relações da confiança com os agentes de implementação dos códigos e de combate a incêndio é um processo contínuo que leva anos a ser cultivado e mantido.
Ron Melucci, P.E. é socio da Rolf Jensen & Associates baseado no escritório de Boston, Massachussets